O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou na última sexta-feira (17) a favor da descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. A votação foi suspensa em seguida, após um pedido de destaque feito pelo decano Gilmar Mendes.
Em seu voto, Barroso afirmou que “as mulheres são seres livres e iguais, dotadas de autonomia, com autodeterminação para fazerem suas escolhas existenciais”. O posicionamento foi registrado em seu último dia no STF antes da aposentadoria.
Barroso seguiu integralmente o entendimento da ministra Rosa Weber, que havia votado a favor da descriminalização às vésperas de sua aposentadoria, em setembro de 2023. Foi ela quem definiu o limite das 12 semanas de gestação.
A discussão ocorre no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, protocolada em 2017 pelo PSOL e pelo Instituto Anis. A ação questiona se a mulher e os profissionais envolvidos no aborto devem responder criminalmente e propõe que o procedimento seja permitido em quaisquer circunstâncias até a 12ª semana, modelo semelhante ao adotado na Alemanha.
Atualmente, a legislação brasileira permite o aborto apenas em três situações: risco de morte para a gestante, gravidez resultante de estupro ou casos de anencefalia do feto. A ação argumenta que a criminalização do aborto, estabelecida em 1940, viola preceitos fundamentais como dignidade, liberdade, igualdade e não discriminação.
As autoras da ação também destacam os riscos enfrentados por mulheres e adolescentes em situação de vulnerabilidade, especialmente as negras e pobres, em razão da prática de abortos inseguros.
A discussão sobre o tema foi objeto de audiência pública em 2018, convocada pela então ministra Rosa Weber, que reuniu especialistas, representantes governamentais e entidades da sociedade civil. Na ocasião, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) manifestou-se contra a descriminalização, argumentando razões éticas, morais e religiosas.
Dados da Pesquisa Nacional do Aborto (2021), realizada pela Universidade de Brasília (UnB), indicam que uma em cada sete mulheres até 40 anos já realizou um aborto, sendo mais comuns entre mulheres com menor escolaridade, negras, indígenas e residentes em regiões mais pobres.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 45% dos abortos realizados no mundo sejam inseguros e que 97% deles ocorram em países em desenvolvimento. O relatório “Tendências na mortalidade materna de 2000 a 2020”, elaborado por agências da ONU, aponta o aborto inseguro como uma das principais causas de mortalidade materna.
Em seu voto, Barroso procurou tratar o tema sob uma perspectiva jurídica e ressaltou o respeito às convicções religiosas que se opõem ao procedimento. “Direitos fundamentais não podem depender da vontade das maiorias políticas. Ninguém duvide: se os homens engravidassem, aborto já não seria tratado como crime há muito tempo”, afirmou o ministro.
RIC