O Parque Estadual das Várzeas do Ivinhema, no Mato Grosso do Sul, não é só o ambiente de trabalho do biólogo Reginaldo Oliveira, mas é também cenário para flagrantes da natureza que emocionam.
Gestor do parque há sete anos, o especialista já clicou 305 espécies de aves, 15 serpentes diferentes e os principais felinos da região, que ‘roubaram a cena’ nos últimos dias: além de fotografar uma onça-pintada às margens de um dos rios do parque, Reginaldo flagrou um gato-palheiro (Leopardus braccatus) melânico – com pelos totalmente pretos, durante uma das rondas no local.
“Costumo sair aos domingos para monitorar a estrada e fotografar espécies e foi em uma dessas saídas de quadriciclo que registrei o gato, atravessando a estrada. Para minha surpresa ele ficou ali, paradinho, curioso para saber quem se aproximava”, conta.
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A observação foi rápida, mas Reginaldo garantiu o flagrante — Foto: Reginaldo Oliveira/VC no TG
A observação durou pouco mais de um minuto, mas garantiu cliques detalhados do animal, que ganham destaque no acervo de fotos do gestor. “Quando vemos um bicho desses, a probabilidade de fotografá-lo é muito pequena, pois são ariscos. Então poder ter registrado ele ali foi muito gratificante”, destaca.
Felinos melânicos
De acordo com o biólogo especialista em felinos, Felipe Peters, o melanismo é uma mutação genética que provoca a produção de melanina (pigmentação preta) em excesso e que, no caso dos felinos, pode ser considerada comum. “Pesquisadores documentam a ocorrência do fenômeno em 13 espécies, sendo que cinco ocorrem no Brasil: onça-pintada, gato-do-mato-pequeno, gato-do-mato-grande, gato-mourisco e gato-palheiro”, diz.
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Indivíduo melânico de gato-do-mato-grande, espécie comum do Pampa — Foto: Fábio Mazim/Arquivo Pessoal
Ele explica ainda que a mutação genética pode também ser influenciada por variáveis ambientais, como altitude, temperatura, radiação solar e umidade, mas que o fenômeno não prejudica o animal. “Na verdade alguns estudos sugerem que essas variantes de pelagem podem apresentar vantagens adaptativas em algumas situações ecológicas. Aqui no Rio Grande do Sul, por exemplo, observamos diversas vezes gatos-do-mato-grande próximos a áreas e residências rurais. Os animais pareciam tranquilos, de modo que os próprios moradores toleravam a presença do predador silvestre, por confundi-lo com algum gato doméstico”, comenta Peters, que destaca ainda outra ‘proteção’ garantida pela pelagem escura.
“Compilamos dados referente ao abate dos gatos-do-mato-grande em decorrência de retaliação e caça esportiva ilegal e verificamos que 100% das peles guardadas como ‘troféu’ eram de animais pintados, não havendo atrativo pelas peles melânicas”, completa.
80% dos gatos-mourisco encontrados nas Américas apresentam melanismo. Já para a onça-pintada apenas 9% dos indivíduos são melânicos, esses, que estão vinculados a áreas de maior cobertura florestal
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Macho de onça-preta é monitorado por pesquisadores — Foto: Instituto NEX
Nas pesquisas realizadas por Peters, Marina Favarini e Fábio Mazim, no extremo sul do Brasil, foi constatada que a ocorrência de melanismo em gatos-do-mato-grande pode atingir até 90% em áreas úmidas localizadas ao sul da Planície Costeira gaúcha e variar de 40% a 60% nas coxilhas da região de Campanha do Sudoeste. “Em contraponto, o gato-do-mato-pequeno apresentou raros registros na Mata Atlântica gaúcha, atingindo até 30% dos registros obtidos com câmera trap na Floresta Nacional de Três Barras (SC)”, destaca Fábio Mazim, ecólogo especialista em carnívoros.
Espécies albinas?
O albinismo é outra alteração genética que ocorre em determinadas espécies da fauna, no entanto, no caso dos felinos brasileiros há registros somente de leucismo, um tipo de albinismo parcial, onde partes do corpo mantém a coloração padrão. “Nesse caso o leucismo é reconhecido pela pele manchada de branco ou totalmente branca, mantendo apenas a coloração dos olhos, característica que exclui a coloração albina”, explica a bióloga Marina Favarini.
Ela destaca que os casos de albinismo em felinos são conhecidos em leões e tigres. “O fenômeno também já foi registrado em um puma, no estado do Rio de Janeiro”, completa.
Fonte: G1.com